sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Uniformologia Militar Portuguesa.9

Capítulo 9. Contexto uniformológico do plano de 1885

A questão do plano de uniformes de 1885 pode ser ligada à reorganização do exército, levada a cabo em 1884, sob a responsabilidade do Ministro e Conselheiro Fontes Pereira de Melo. Esta reorganização marcou um passo no relançamento de uma ideia global de defesa eficaz da nação, conforme se pode verificar no discurso de apresentação deste projecto de lei na Câmara dos Deputados: “Ninguém contesta a urgência de dar ao nosso exército uma nova organização, pela qual tenha o país a garantia de uma defesa regular e prolongada, em harmonia com a sua população e os seus recursos; querem todos, porém, que não aumente a despesa que se faz com o ministério da guerra. O problema posto nestes termos é insolúvel.” (A. Coelho, 1988, p. 21). Mas se a reorganização perduraria mais ou menos intacta, mesmo com as alterações do sucessor de Fontes Pereira de Melo, o Conde de S. Januário e do General Sebastião Teles, não se registando desvios aos princípios gerais da comissão de 1884 (idem, p. 53), já o plano de 1885 vai ceder ao hábito de sofrer contínuas alterações, modificações ou supressões, e tal sucede, curiosamente, logo após a demissão do Ministro da Guerra, em 20 de Fevereiro de 1886, seguido do seu falecimento, decorrido quase um ano depois, em 22 de Janeiro de 1887.
Tão ambicioso como a reorganização do exército, este plano de 1885, que erradicara o figurino afrancesado de 1856, 1868 e 1869, adoptaria sem hesitações a aparência prussianizante que é patente nos seus fardamentos. Seria, sem dúvida, um passo muito dispendioso a dar, para reuniformizar todo o exército, mas estava-se decidido a dá-lo. A prová-lo está a própria estrutura do plano, que era muito completo, eloquente e sem mal entendidos quanto às matérias decretadas, em tudo auxiliado por uma iconografia excelente e de fácil compreensão.
O plano de uniformes contido na O.E. nº 15 de 5/10/1885, já decretado em 1 de Outubro desse ano, é precedido de uma longa série de disposições gerais que regulamentariam todos os aspectos essenciais para implementação desta nova legislatura sobre os fardamentos do Exército Português.
A cor azul ferrete era mantida nos casacos, dolmans e barretes de pequeno uniforme, para o Estado Maior General (E.M.G), Corpo de Estado Maior (C.E.M), das Armas de engenharia, artilharia e cavalaria. A cor pinhão era alargada dos caçadores para os regimentos de infantaria de linha, diferenciando-se uns e outros pela cor das golas; negras para caçadores e encarnadas para a infantaria de linha. Para além da infantaria de linha, as golas encarnadas eram destinadas também ao E.M.G, ao C.E.M., à artilharia e cavalaria, enquanto que a engenharia usaria golas de tecido preto como os caçadores. Para as unidades não combatentes as golas seriam em azul claro, carmesim para os serviços de saúde militar e golas brancas para militares na reforma até ao posto de coronel.
O pano designado de mescla escura, que deveria ser quase negra, seria usado para a confecção dos capotes e das calças do Exército, com excepção das calças de infantaria e caçadores que seriam em pano ou saragoça cor de pinhão. Ao Estado Maior General reservava-se o uso exclusivo da calça azul ferrete para o grande uniforme ou 1o uniforme (O.E. nº 15 de 5/10/1885, título I, capítulo I, p. 308).
Do artigo 5º ao artigo 7º do capítulo I das disposições gerais, são especificados os pormenores relativos às calças regulamentares. Assim, as listas de pano para aplicação na parte exterior das calças deveriam medir 2,2 cm de largura e, quando fossem duplas, teriam um espaço intermédio de 3 mm. Esta última medida aplicava-se igualmente aos vivos que guarneciam todo o fardamento. Este tipo de ornamentação teria a mesma cor das golas dos casacos e dos dolmans. Abria-se uma excepção para as calças azuis ferrete, dos oficiais generais, a que se aplicava galão de ouro, que nesta O.E. é denominado de Imperador. O comprimento das calças dos sargentos e praças apeados devia ser embainhado, de maneira a que ficasse distante do solo 3,3 cm, tendo os pés unidos, em posição de sentido. Para as tropas montadas, a calça devia ser mais comprida, de maneira a assentar sobre a pua da espora, ao nível do tacão da bota.
Os oficiais não são referidos neste caso, o que demonstra o seu estatuto superior, e a liberdade de assentarem as calças sobre o calçado, conforme a sua altura ou compleição (idem, capítulo I, artigos 5º a 7º, p. 309). Seguidamente foi contemplado o capote, no qual, conforme o modelo, variava a distância da bainha, ou orla, até ao solo. Nas tropas apeadas essa distância mediria 33 cm, e nas tropas montadas ficava-se pelos 20 cm, isto para melhor proteger o usuário quando no serviço a cavalo.
Em relação aos 22 cm determinados em 1856, verificamos que a bainha dos capotes de tropas apeadas sobe 11 cm, dando eco a muitas queixas, cujo argumento se baseava no embaraço de movimentos, causado pelo excessivo comprimento e peso das abas inferiores do capote. (O.E. nº 15 de 5/10/1885, título I, capítulo I, artigos 5º a 7º, p. 309). Para as tropas a cavalo, não se verificam alterações nas medidas desta natureza.
Para o reforço de protecção, tanto para a chuva como para o frio, todos os modelos continuariam a possuir um cabeção de dimensões variáveis, amovível e que se fixava por meio de três pequenos botões. Um desses botões era pregado na costura central que unia a gola ao capote e os outros dois nas extremidades. No caso do cabeção curto, mais apropriado para tropas apeadas, a orla alcançava o meio do antebraço. Na versão longa, de cavalaria, a orla deveria chegar à última falange dos dedos das mãos, quando os braços estivessem estendidos naturalmente ao longo do corpo (idem, ibidem).
Quanto às peças superiores básicas, ou seja, o casaco, o dolman e a jaqueta, as suas golas são redefinidas. Com a introdução definitiva da gola aberta, mediria 20º a incidência do ângulo da referida abertura. Estas golas teriam uma altura variável de 3,5 a 4 cm, conforme a peça, e os cantos deviam ser arredondados. Abdicando-se definitivamente das cores regimentais, a distinção passa a ser feita através de emblemas de Arma, ou números regimentais, que para os oficiais seriam bordados a ouro. Para os sargentos e praças, os emblemas e números seriam de metal, excepto nas jaquetas e na sua extrapolação, o jaleco, aonde seriam recortados em pano da cor da gola dos casacos, excepto para os caçadores que os teriam em cor verde.
Em termos descritivos, estes emblemas consistiam em: para os generais, um bordado a ouro na gola do casaco, herdeiro do modelo (à austríaca) de 1856. O modelo é visível na figura nº 1 da O.E n 15 de 5/10/1885. Os generais de divisão usavam três estrelas de prata e os generais de brigada só duas similares. A figura nº 29 demonstra a configuração dessa estrela de cinco pontas. A sua colocação na gola do dolman é descrita na figura nº 2 do plano de ilustrações explicativas desta O.E.. O emblema do Corpo de Estado Maior do Exército, a colocar na gola do dolman, consistia no óculo e na espada cruzados (conforme se pode ver na figura nº 4) e num galão de ouro do padrão representado na figura nº 3, esse a ser aplicado na gola do casaco em grande uniforme.
A Arma de engenharia continuava a ser representada por um castelo (figura nº 5), cuja aplicação era comum ao casaco e ao dolman. Esse conceito era similar ao determinado para a artilharia, cujo emblema era uma granada flamejante (figura nº 6) e, para a cavalaria, variavam os emblemas entre os sabres cruzados para caçadores a cavalo e as lanças cruzadas para os lanceiros (figuras nº 7 e nº 8). A infantaria continuava a usar os mosquetes cruzados, símbolo que se estendeu aos caçadores a pé, deixando de arvorar a tradicional corneta (figuras nº 9 e nº 10).
Continua

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Medalhas da Guerra Peninsular.

Aqui ficam esta execlente imagem de medalhas de comando e cruzes portuguesas da guerra peninsular.





Fazem parte de um catalogo da Christie’s.( aqui )





Uma delícia.

Uniformologia Militar Portuguesa.8

Capítulo 8. Os Contingentes Coloniais
Um dos factores de evolução uniformológica que se torna visível a partir de 1870 é a influência colonial.
Em 1871, Portugal vê-se na contingência de enviar para o Estado da Índia (Goa) um batalhão expedicionário de infantaria para integrar a guarnição daquele território ultramarino. A reestruturação da guarnição havia sido levada a cabo pelo novo governador, Macedo e Couto, que havia substituído o visconde de S. Januário. A nova estrutura passava a ser constituída por oito companhias de polícia, uma bateria de artilharia operada para tropas indígenas e um batalhão de infantaria da metrópole. Esse batalhão teria sido enviado para intervir contra um levantamento de tropas indígenas contra o antigo governador, o visconde de S. Januário. Partindo em Novembro de 1871, sob o comando de Francisco José da Silva, e acompanhado pelo infante D. Augusto e o novo governador Macedo e Couto, este batalhão não chega a entrar em acção, graças ao acalmar da situação. No entanto, devido ao reacender dos motins, o batalhão metropolitano acabaria por entrar em campanha (Martins, 1945, p. 401- 412).
As Ordens do Exército da época são bem claras quanto à preparação deste batalhão para a Índia, introduzindo acessórios com funções específicas para operações coloniais: “Secretaria d’estado dos negócios da guerra - Direcção Geral - 4ª Repartição - Illmº exmº Sr. - S. exª o ministro da guerra encarrega-me de dizer a v. exª que se sirva ordenar que sejam feitas com a máxima brevidade seiscentas capas de linho branco para barretinas, as quaes devem cobrir a pala e ser guarnecidas de rebuço; por isso que são destinadas ao batalhão de caçadores nº 1, que brevemente seguirá viagem para Goa.
Deus guarde a v. exª Secretaria d’estado dos negócios da guerra - Illmº e exmº sr. Director geral de artilharia - o director geral, D. António José de Mello.
Secretaria d’estado dos negócios da guerra - Direcção Geral - 4ª Repartição - Urgente - Comunica-se à direcção da administração militar que s. exª o ministro da guerra determina que, pela mesma administração, se proceda à compra de mil camisolas de malha de algodão para serem immediatamente fornecidas ao batalhão de caçadores nº 1, que vai seguir viagem para a Índia” (O.E. nº 43 de 3/10/1871, p. 336).
Na O.E. nº 44 de 10 de Outubro de 1871 é publicado o plano descritivo, sem iconografia, de fardamento, armamento e equipamento para o batalhão expedicionário para a Índia. Não foram designados quaisquer tipos de barretina nem mesmo a regulamentar de 1868 - 1869, optando-se por um barrete, em forma de képi com tampo mole. Era confeccionado em pano azul ferrete, os vivos encarnados e sem penacho. A pala era quadrada, envernizada de preto pela parte superior e verde no lado inferior; a correia era envernizada de preto com fivela de latão. Para completar o conjunto eram aplicadas, quando necessário, as capas de pano de linho branco, que ajudariam a suportar o efeito directo do sol.
O casaco seria talhado sem recorte de cintura e folgado. A calça de grande uniforme continuava a ser o modelo de mescla escura e para marchas e serviço de caserna era distribuída a versão em brim branco.
Todo o restante equipamento, como gravata, calçado, divisas das praças graduadas (sargentos e cabos), capote, artigos de fardamento e pequeno equipamento da dotação individual, permanecia o das ordenanças de 1856 e 1868 - 1869.
No caso específico dos oficiais, todos os artigos de uniforme e equipamento eram similares aos dos sargentos e praças, diferindo pela melhor qualidade dos panos empregues na confecção do barrete, do casaco e das calças. Os botões dos casacos seriam dourados e não de metal amarelo, continuando-se a usar as charlateiras regulamentares, assim como a banda e as luvas dos oficiais de infantaria dos regimentos da metrópole.
Quanto ao armamento, este era o usado pelas unidades de infantaria do Exército, consistindo no sabre regulamentar para os oficiais e muito provavelmente modelos de revólver de aquisição particular. Os sargentos e praças seriam equipados com a carabina para caçadores, de retrocarga, Westley-Richards, de calibre 14 mm. Para além do sabre-baioneta que acompanhava a respectiva arma, o correame que equiparia as tropas seria do mesmo modelo da infantaria de linha, consistindo no cinturão, nas cartucheiras e nas patronas introduzidos em 1855, mais os necessários bornais, cantis e mochilas que formavam a dotação de campanha (O.E. nº 44 de 10/10/1871).
Como já se pôde verificar, o batalhão expedicionário português enviado à Índia, em 1871, ia basicamente uniformizado com fardamentos adaptados ao clima nacional e não aos climas tropicais, mantendo o uso do sombrio casaco de pano azul ferrete e das não menos sombrias calças de mescla. Embora se contemplassem as calças de brim branco, de pequeno uniforme, para uso nas marchas e faxinas, a outra única concessão ao clima quente e húmido era a capa de linho branco para o képi, que também era confeccionado com pano azul ferrete. Por conservadorismo, ou por ignorância do teatro de campanha que ia enfrentar, a comissão encarregada de organizar o batalhão não optou por criar um uniforme tropical, em pano branco ou mesmo khaki, como já havia feito a Inglaterra.
Na verdade, estas intervenções militares portuguesas nas suas possessões ultramarinas são ainda pontuais e a experiência militar colonial não era então suficiente para se formar um real juízo das necessidades dos soldados em campanha fora de Portugal. Contudo, pena é que não se decidisse seguir cegamente um figurino colonial inglês ou francês, já com provas dadas, optando-se por realizar uma versão do uniforme metropolitano.
Se assim aconteceu na expedição de 1871, o mesmo se repete na campanha dos Dembos, em Angola, quando se enviou um batalhão expedicionário. O plano de fardamento desta unidade é em tudo semelhante ao já decretado para o batalhão enviado à Índia (O.E. nº 43 de 3/10/1871, p. 348 - 349). A única diferença surge no casaco, cujos vivos e presilhas de ombro são brancos em vez dos encarnados de 1871. Também o forro, em lugar do pano encarnado, é de tecido preto (O.E. nº 5 de 15/2/1873, p. 39).
O armamento e o correame também diferem, começando pelo primeiro, em que a carabina Westley-Richards é substituída pela nova espingarda de retrocarga do modelo Snider-Barnett m/1872, com que se equiparam os sargentos e praças. Aquele tipo de arma surgia a partir da antiga espingarda Enfield, estriada, a que era aplicada uma nova culatra de alçapão do referido modelo Snider de concepção britânica. Os oficiais, tal como em 1871, teriam a espada regulamentar do exército da metrópole e também a provável posse particular de revólveres para defesa pessoal. O correame seria em anta branca, assim como as cartucheiras e patronas. A mochila de víveres seria confeccionada em pano de brim cru branco, os malotes do capote em material semelhante e o cantil seria em folha de Flandres (idem, p. 40). No último caso, seria de imaginar o efeito do calor sobre um cantil de água (ou vinho) feito em chapa, que não estivesse devidamente isolado por tecido ou cortiça.
Assim, o princípio e o conceito que deram origem ao batalhão expedicionário à Índia em 1871, voltam a ser usados em 1873. Enviar tropas para climas tropicais ou aproximados com fardamentos adaptados ao clima temperado europeu, revelava total desconexão com a realidade das campanhas em teatro colonial. Um soldado desses batalhões só poderia contar com a boa vontade de um corpo de oficiais que lhe permitisse combater em camisola de algodão e com as calças de brim. E para se cobrir restava-lhe o képi azul, embora encapado de branco, já que este acumulava as funções de barretina e barrete de caserna.
Como foi possível verificar ao longo deste texto, a evolução do uniforme militar português nos períodos iniciais da Regeneração, para além dos planos de fardamento, foi pautada por numerosos decretos, portarias e circulares que alteravam, modificavam ou ampliavam as legislaturas de base. Muitas circunstâncias estão documentadas, outras situam-se no campo das hipóteses que, carecendo de comprovação documental, podem servir para futuras propostas de trabalho ou de debate.
Continua

domingo, 23 de novembro de 2008

Uniformologia Militar Portuguesa.7

Capítulo 7. A introdução da moda militar francesa.

A Ordem do Exército nº 80 de 31 de Janeiro de 1868 é o ponto de partida das novas modificações nos fardamentos do exército, que além de apontarem para uma relativa simplificação, são a assumida adopção do estilo francês. Desta vez, todas as alterações, modificações ou novos modelos foram descritos de forma gráfica, através de gravuras explicativas, contendo os talhes, feitios e dimensões em centímetros.
A grande novidade deste plano foi a nova barretina, tombada para a frente, à francesa, tipo képi. O modelo de barretina francesa de 1862 teria servido de inspiração à nossa nova barretina de 1868, sendo o recorte praticamente igual, assim como a altura do conjunto (13,5 cm). Estranhamente a barretina portuguesa não apresentava furos de ventilação passiva visíveis. Confeccionadas em couro negro, estas barretinas eram reforçadas no topo, em baixo, e verticalmente, com duas tiras em V em cada lado, existindo ainda um reforço semicircular na parte posterior. As alhetas e as cadeias são abandonadas a favor da tira de couro com fivela. A pala, que deveria ser de couro envernizado preto, era recta, arredondando nas extremidades. Media 17 cm de largura e 4,2 cm de comprimento, ficando a 90º em relação ao eixo do casco.
O penacho, agora de uso geral, tornara-se cónico, assentando sobre uma túlipa metálica de dois modelos, um mais elaborado, que se pode observar montado na barretina, para oficiais, e outro mais simples para sargentos e praças e que está representado ao lado esquerdo do primeiro (Vd. quadro iconográfico nº 1 da O.E. nº 80 de 31/12/1868).
A chapa é mais uma vez substituída, abandonando-se o troféu de armas de 1856, assim como a corneta de caçadores, para se voltar a usar a chapa em forma de sol, onde seriam colocados pequenos círculos de 4 cm, com o emblema da respectiva Arma. As barretinas para os sargentos ajudantes, sargentos quartéis-mestres e contramestres de música, seriam deste modelo, mas com o casco de feltro.
Os casacos (representados na folha com o quadro iconográfico nº 1) continuaram a apresentar o feitio cintado, tendo já as golas baixas e abertas, com canhões da manga em ângulo, excepto para infantaria (Vd. quadro iconográfico nº 2 da O.E. nº 80 de 31/12/1868). Os casacos para caçadores a pé deixaram de ter alamares, embora conservassem os nós húngaros nos canhões das mangas; na gola deveria ser aplicada uma fita preta de 1,2 cm. Os caçadores a cavalo, embora conservassem a jaqueta à hussarda, do grande uniforme, tinham para serviço de quartel um casaco que agora deveria ser similar aos dos caçadores a pé. Os casacos das tropas apeadas continuaram a ter presilhas de ombro, e as dos oficiais e tropas a cavalo possuíam passadores para as charlateiras. As pestanas das abas posteriores são modificadas, passando a ter três botões de cada lado em vez dos dois do modelo de 1856 (Vd. quadro iconográfico nº 2 da O.E. nº 80 de 31/12/1868).
De um modo geral, os modelos de casaco do Exército foram simplificados e relativamente estandardizados. As jaquetas, cujos moldes estão presentes no quadro nº 2, assim como os bonés de caserna (tachinhos), continuaram a ser confeccionados em pano azul ferrete e saragoça.
Pela primeira vez a roupa branca é representada exactamente: a camisa que abria só até meio do peito e não tinha colarinhos rebatíveis, e a ceroula que possuía cordões para ajustar à cintura e também aos tornozelos.
A Ordem do Exército nº 80 não se limitou, contudo, a apresentar as gravuras explicativas do figurino a adoptar. Decretou igualmente as regras para o fornecimento de vestuário e calçado para o Exército, através de arrematações, sendo estas fiscalizadas e inspeccionadas pelo Arsenal do Exército. Além disso regulamentavam-se os tipos de pagamento sobre os artigos de fardamento a fornecer às tropas.
Esta O.E. nº 80 delineou o figurino definitivo do Exército Português até ao plano de uniformes de 1885, com apenas algumas pequenas alterações pontuais.
À O.E. nº 80 de 31 de Dezembro de 1868, cujo conteúdo principal se baseava na informação gráfica, vêm-se somar descrições mais pormenorizadas num processo gradual ao longo do ano seguinte. Assim, em decreto de 14 de Janeiro de 1869 (O.E. nº 4 de 19/1/1869) são regulamentadas as alterações aos uniformes do modelo de 1856 ainda usados pelos oficiais.
Todo este processo de modificação dos uniformes de 1856, levado a cabo entre 1868 e 1869, regularizou-se e simplificou de tal forma o figurino militar português, apesar do profundo afrancesamento deste, que até 1876 as críticas aos sistemas de fardamentos vão-se manter em silêncio, pelo menos na Revista Militar onde, até à data referida, os uniformes deixam de estar sob a mira dos articulistas. Parecia ter-se chegado a um ponto de equilíbrio entre o decretado para os uniformes e a realidade do uso dos mesmos, porque as queixas quase desapareceram, deixando de ser tornadas públicas durante quase oito anos.
Continua

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Uniformologia Militar Portuguesa.6

Capítulo 6. A transição para a Regeneração
No ano de 1852, em pleno início da Regeneração, num novo tipo de regime que pretendia solidificar a figura do Estado, havia que obrigatoriamente reestruturar a força armada da Nação e ao mesmo tempo refazer a sua imagem: criar um exército pequeno, contudo disciplinado e equipado, marcando a distância com a sociedade civil, destinado primeiro à defesa e só depois ao policiamento interno. Contudo não se podia levar a cabo tal projecto sem atentar às exauridas finanças nacionais e aos limitados orçamentos militares, mesmo implicando questões aparentemente pacíficas como a aparência das tropas. O plano de uniformes de 1848, com a aquisição dos novos fardamentos para substituir os dos modelos de 1834, implicava uma série de novas despesas que muitos militares, mesmo oficiais abastados, não estariam dispostos a fazer de imediato. Aliada à ausência de moral e sentido profissional, a transição e modificação da aparência do soldado era ainda mais lenta, sobretudo se as oficinas e os abastecimentos de tecidos e materiais não satisfizessem atempadamente as necessidades dos arsenais.
Esta situação havia sido comentada em 1849 numa crónica interna da Revista Militar (1849, p. 115 - 116) em que, no dia 2 de Janeiro daquele ano, na parada de honra à sessão de abertura das cortes, se fez notar que algumas unidades de 1ª linha, não especificadas no texto, se apresentaram em pequeno uniforme, alegadamente devido às demoras na distribuição dos novos fardamentos. A crítica surge motivada pela solenidade do acto, assim como pela presença de entidades estrangeiras, o que afectava a imagem do Estado, principalmente pouco após o trauma da guerra de 1846. Nesse artigo sugeria-se que só deveriam ter comparecido as unidades já devidamente uniformizadas segundo o plano de 1848.
O período entre 1850 e 1852 destacou-se, sobretudo, pelas extensas modificações e alterações ao plano de 1848, demonstrando a incapacidade das comissões encarregadas de elaborar as legislaturas sobre uniformes em redigir um texto definitivo e coerente. Era assim dificultada a sua aplicação, criavam-se vazios legislativos que obrigavam a decretos a posteriori, com funções complementares. Tal poderia justificar a onda legislativa sobre uniformes, com o seu auge em 1852, já na vigência dos gabinetes regeneradores, deixando a sua presença no plano de 1848.
Após os períodos conturbados de 1848 em que a Europa se viu afectada por crises político-militares e sócio-económicas, às quais Portugal não ficou alheio, fosse pela Guerra da Patuleia de 1846 - 1847, fosse pelos processos políticos que antecederam a Regeneração (1851), seguiu-se um período de relativa paz europeia à excepção da Guerra da Crimeia de 1852 -1854.
É nesse contexto de relativa acalmia política que se decreta o plano de uniformes de 1856, após a existência agitada dos fardamentos do plano de 1848, constantemente sujeitos a modificações e alterações, como sucedeu em 1850, 1851 e 1852.
Desta vez, este plano de uniformes não surge de um só decreto, mas foi dividido em várias partes, cada uma delas respeitando a diferentes Armas e serviços. Pode-se afirmar que foi um plano bastante pormenorizado, tanto no plano descritivo como no plano esquemático, embora não apresente figuras de corpo inteiro de soldados e oficiais em fardamento completo, como havia sucedido em 1834 e 1848.
Além do casaco, surge um novo calçado para infantaria, baseado nas já referidas experiências de 1855, constituído por sapato aberto com cordões, ao qual se junta polaina de couro fixa com fivelas, mas usando-se por debaixo da calça. Continuamos aqui a levantar dúvidas quanto à utilidade deste processo de uso da nova polaina.
As calças, em geral, seriam feitas num novo padrão de mescla, que teria sido distribuído em pequenas amostras acompanhando os planos destinados às unidades militares. Dando crédito às aguarelas do Coronel Ribeiro Arthur, que ilustram os militares saídos do plano de 1856, a mescla das calças seria consideravelmente mais clara do que a usada a partir de 1848. Para o Verão, integrada no pequeno uniforme, é claramente citada a calça branca de brim, que não havia sido referida em 1834 e 1848.
As barretinas mantêm-se no padrão de 1848, mas as antigas chapas de estrela com coroa real e designação regimental são substituídas por novos modelos que consistiam num troféu de armas à volta do escudo real português (O.E. nº 16 de 2/4/1856, decreto de 10 de Março).
Uma das inovações mais importantes e que reflecte claramente a adopção de figurinos estrangeiros surge nos regimentos de caçadores a cavalo. Estes, conforme o artigo correspondente na Ordem do Exército nº 22, de 6 de Maio de 1856, passam a usar jaqueta cor de saragoça, tal como os caçadores de infantaria. Neste caso, este tipo de regimentos passa a apresentar uma aparência profundamente afrancesada, similar às unidades de hussardos do período de Napoleão III.
No plano de 1856 surgiu um item muito interessante e inovador quanto ao nível de informação dado em planos de uniformes anteriores, tratando-se de uma descrição pormenorizada dos pertences que constituíam a dotação individual do soldado:
· uma barretina com capa de oleado (modelo de 1848)
· um penacho
· cordões para a barretina
· um casaco (grande uniforme)
· uma gravata (grande uniforme)
· um par de calças de saragoça (grande uniforme)
· dois pares de calças de brim (pequeno uniforme)
· um barrete de “polícia” (modelo de 1852, para pequeno uniforme)
· uma jaqueta de “polícia” (pequeno uniforme)
· três camisas (uso geral)
· dois pares de sapatos (uso geral)
· um par de polainas (grande uniforme)
· um capote (uso geral)
· uma escova de fato
· uma escova de botas
· um espelho circular, protegido por caixa metálica com 8 cm de diâmetro
· uma navalha de barba
· um pente fino
· uma tesoura pequena
· um “agulheiro de páo” com agulhas
· um pequeno saco de “panninho” com linhas e botões
· uma faca sem ponta com 17 cm de comprimento (Rancho)
· um garfo de 17 cm de comprimento (Rancho)
· uma colher de 17 cm de comprimento (Rancho)
· uma caixa de graxa para calçado
· uma caixa com graxa de cera preta e pomada para o armamento
Como podemos verificar são distribuídos vinte e seis artigos que constituem o vestuário regulamentar e respectivos acessórios de atavio e de higiene. É patente a intenção de racionalizar e disciplinar a dotação individual do militar e o uso que o próprio lhe poderá dar. Podem-se encontrar aqui conceitos essenciais, que dizem respeito à disciplina do uniforme e da aparência e um reflexo do reinado breve, mas esclarecido, de D. Pedro V. O fardamento devia identificar o portador como personagem social e gerar uma melhor e elitizada imagem perante a sociedade.
Às amplas reestruturações de 1856 não é estranha a acção do jovem rei D. Pedro V, que desde cedo demonstrou grande interesse e lucidez de ideias quanto à necessidade da existência de um exército eficaz e bem armado, o que pode ser verificado através da leitura da obra “D. Pedro V e os assuntos militares”, tese de doutoramento do Doutor Fortunato Queirós, publicada pela FLUP em 1972.
O plano de uniformes de 1856 foi o primeiro passo da adopção do figurino francês, assim como uma real actualização da estrutura uniformológica do Exército Português, colocando-o mais de acordo com a sua época.
Um ano antes do plano de 1856 já se havia levado a cabo a experimentação dos novos fardamentos, onde sobressaía o casaco. Passava-se a usar uma peça actualizada, cuja adopção tardia coincidia com a situação similar do exército britânico, que usava casaco ou túnica desde 1855. Tal justificava um processo de evolução paritário, em que a Inglaterra se adiantava a Portugal numa pequena margem cronológica, e ambos se distanciavam de outras potências europeias de dez a vinte anos, isto apesar de o Exército Português se ter afastado dos estilos britânicos.
Em termos específicos, o plano de 1856 trouxe de novo o casaco para todos os graus hierárquicos e para a maioria dos corpos do Exército, à excepção dos caçadores a cavalo que iriam estrear uma nova jaqueta. Esta, profusamente decorada com alamares e brandbourgs, era confeccionada em saragoça, à semelhança dos caçadores de infantaria. A nova jaqueta vinha aproximar os seis regimentos de caçadores a cavalo de um estilo declaradamente gaulês, ao estilo dos chasseurs à cheval ou dos hussards do exército de Napoleão III, acentuando um certo carácter de elite da cavalaria ligeira, juntamente com os dois regimentos de lanceiros.
O capote passou a generalizar-se como vestuário de Inverno de todos os postos hierárquicos do Exército, substituindo a antiga sobrecasaca e o efémero “sobre-tudo” de 1852.
Prenunciando os fardamentos exclusivos para as faxinas e trabalhos de caserna (não excluindo exercícios de manobra), surgiu a jaqueta de brim branco que, no entanto, teve uma existência atribulada, devido às críticas que a caracterizavam como mal adaptada e incómoda para aquelas funções, acabando por ser temporariamente suprimida para voltar a ser mencionada no plano de 1885, secundando a jaqueta de pequeno uniforme em panos azul ferrete ou cor de pinhão.
Manteve-se o bivaque do modelo de 1852 e o boné de pala de 1848 para o corpo de oficiais, à excepção do modelo à austríaca destinado aos oficiais superiores.
O calçado, peça essencial do uniforme militar, seria igualmente reformulado, deixando de se usar os modelos de 1834 (sapato abotinado) para se introduzir um sapato convencional com atacadores, secundado por polainas também de atacadores mas que se usavam sob o cano das calças. Esta foi uma medida deveras criticada na Revista Militar, pois (apontando para o exemplo francês que sobrepunha a polaina à calça, à excepção do uniforme de passeio e nos serviços internos), a polaina não cumpria, assim, a sua função protectora, tanto da perna como da calça. De facto, torna-se discutível o uso da polaina, tal como decretado no plano de 1856, devido à indefinição das comissões legislativas quanto ao uso deste artigo.
Quando foi publicado o plano de 1856, os equipamentos e acessórios das tropas, especialmente apeadas, haviam sido renovados em 1855, com a aquisição à Bélgica e à Inglaterra de novas mochilas, e com a introdução de novos cinturões que serviam de suporte simultâneo à patrona, bolsa de fulminantes e conjunto da baioneta.
Neste plano de uniformes, impôs-se um prazo de seis meses, a partir de 1 de Março de 1856, para que fosse rigorosamente cumprido o plano de fardamentos decretados nas Ordens do Exército nº 11 e nº 17. Isto significava que os legisladores e comandos do Exército queriam evitar os habituais atrasos na implementação dos novos uniformes, evitando situações como as criadas a partir do plano de 1848, onde se arrastaram as modificações, as alterações e as ampliações, verificadas em 1850, 1851 e 1852.
Apesar do incipiente experimentalismo levado a cabo para a elaboração do plano de 1856, com a consequente tentativa de racionalização dos fardamentos e dotações individuais das tropas, o exemplo da jaqueta, e mais tarde de quase todo o contexto uniformológico de 1856, vai demonstrar que as nomeações de responsáveis para a elaboração de planos de uniformes continuavam a deixar de lado militares com a devida noção do equilíbrio entre a aparência, a ergonomia, a higiene e a resistência, que começavam a ser características vulgares em qualquer exército europeu da segunda metade do século XIX. Tal não significava que no Exército Português da época não existissem, sobretudo, oficiais com a percepção do conceito acima referido. Deles partiam as críticas, que graças aos conhecimentos e à cultura obtidos a partir do que de melhor se fazia na Europa, e mesmo pelo uso do simples bom-senso, eram extremamente válidas, sobretudo quando publicadas. O púlpito preferencial para veicular essas críticas, a Revista Militar, deixou-nos testemunhos comprovativos de que, apesar das dificuldades e das indecisões eternas que caracterizavam o funcionamento do exército português do século XIX, existiam militares lúcidos e cultos, curiosamente das patentes inferiores a major, indicando uma nova geração de oficiais e posteriormente sargentos, que irão protagonizar os papéis críticos da viragem do século XIX para os inícios do século XX.
Ainda em 1858, um frequente articulista da Revista Militar, Cunha Vianna, do qual não sabemos a patente nem a unidade, estabeleceu um bem estruturado raciocínio sobre a questão da concepção dos uniformes militares, no caso, portugueses, e que se insere na linha de pensamento deste trabalho.
Assim, Cunha Vianna afirmava que, em relação aos planos ou às deliberações sobre uniformes do Exército Português, estes eram subordinados a um figurino, que era sobretudo copiado de modelos estrangeiros, como por exemplo as barretinas: a de 1834, influenciada pelo desenho prussiano e inglês pós-1815, a de 1848 pelo figurino francês, ou então os bonés de caserna, do género “tachinho” (Pires, 1935, folha nº 137) cuja influência é nitidamente inglesa, para em 1852 se adoptar um boné tipo bivaque, baseado no barrete à la dragonne do exército francês e em modelos similares do exército espanhol. Dez anos mais tarde, o Exército Português adopta a cópia quase perfeita do képi-barretina francês, modelo de 1860, sobrepondo-se os ditames da moda militar europeia, cujas realidades diferiam de país para país, às necessidades e comodidades dos militares que o deveriam usar. Ficava posta de lado a articulação de um sistema útil em campanha com os caracteres económicos de um exército, que não queria sacrificar o aparato, mais apropriado à paz do que aos novos tipos de guerra da segunda metade do século XIX.
O procurado equilíbrio de factores que o autor do artigo enunciava, e que não via realizado no Exército Português, resumia-o a três pontos ou condições.
A primeira condição faz adaptar o plano de uniformes à primazia dos rigores do serviço de campanha, o mais desgastante para as tropas, independentemente do clima ou das condições do terreno. Era necessária flexibilidade para que os fardamentos se adaptassem a tais condições, implicando a conjugação da protecção com a leveza.
A segunda condição articula-se com a primeira, porque o factor económico relacionar-se-ia com a exigência de um sistema (“trem” no original) de armas o mais ligeiro possível, como condição essencial para a mobilidade, tendo em conta o país ou zona onde se realiza a campanha. Cunha Vianna vaticinava, sem o saber, a série de campanhas coloniais a que o Exército Português teve de acorrer por diversas circunstâncias e aonde se pôs realmente à prova o cruzamento entre o pragmatismo e as exigências do terreno, como por exemplo nas campanhas na Índia em 1871, em Angola em 1873, e a pacificação de Moçambique a partir de 1894.
A terceira condição, que marca o equilíbrio, baseava-se no necessário aparato marcial do Exército, como imagem do Estado e do Reino. Independentemente do gosto ou do figurino, era uma posição delicada, pois o excesso de aparato implicava a desarticulação com as duas primeiras situações, deixando o Exército de possuir a necessária operacionalidade. Essa operacionalidade, pilar fundamental da soberania nacional, deixaria de o ser para se tornar uma extensa guarda palaciana, versão alongada de um exército de conto de fadas, decorativo e inútil.
Qualquer tentativa de racionalizar os sistemas de fardamento do Exército Português, não devia pôr de parte a análise dos figurinos estrangeiros, mas como Cunha Vianna teorizava, era uma necessidade, sobretudo com realidades próximas da nossa. Contudo, escrevia o autor: “mas esse trabalho deve tomar o carácter de estudo, para delle se tirar as convenientes applicações, e não sacrificar a reflexão à authoridade, muitas vezes experimental, de um qualquer systema, só porque é seguido por aqueles a quem cedemos o glorioso título de nação guerreira (…)” (Revista Militar, 1858, p. 384).
Os uniformes introduzidos pelo plano de 1856, apesar das muitas modificações que comportaram, começaram a mostrar deficiências, tanto no planeamento como na aplicação e qualidade dos materiais.
Desde 1858 que não eram decretadas quaisquer determinações relativas aos uniformes de 1856, parecendo que o processo de implementação decorria sem percalços. Mas em 1860 essa questão volta a ser abordada na Revista Militar, de maneira mais específica e pragmática do que Cunha Vianna o havia feito dois anos antes. A abordagem é incisiva e generalizada, mas não se desliga dos princípios básicos enunciados por Cunha Vianna. O autor, o capitão Luiz Augusto Pimentel, do Regimento de Infantaria nº 17, começou por afirmar, sem qualquer rodeio, que os uniformes de infantaria (os de 1856) não eram elegantes, nem tão pouco cómodos. Com a supressão das antigas fardas de abas, teria sido suposto aligeirar a pesada massa de fardamento e equipamento que o infante português devia transportar, tornando-o vulnerável à fadiga e ao desgaste provocado pelas marchas forçadas de longo curso e mesmo, segundo o autor, para marchas de rotina curtas.
A má gestão das dotações individuais de fardamento, assim como a falta de disciplina de uso, continuava em 1860 a provocar o excesso de carga que o soldado deveria transportar em campanha, o que infere que não deixaria quaisquer dos seus pertences no quartel ou unidade. Aquele excesso de material acabava também por onerar os pequenos recursos financeiros do soldado.
É pertinente referir o que o capitão Luiz A. Pimentel sugeria como alternativa ao estado geral dos fardamentos das tropas. Ele propunha a abolição do capote, sendo a função acumulada pelo casaco que, redesenhado, seria largo, “airoso”, com forros, chumaços e a gola aberta. Para proteger a cabeça e os ombros da chuva, existiria um capuz amplo, adaptável ao casaco por meio de botões, sendo suficientemente largo para cobrir a cabeça e a barretina, secundado por um cabeção para os ombros. O casaco, usado sobre a camisa durante o Verão, era reforçado por um colete forrado durante o Inverno.
Em grande uniforme, o casaco (sem o capuz) ornar-se-ia com dragonas de franja comprida, à francesa, com os distintivos das especialidades e da Arma.
Antecipando-se em pensamento ao que viria a ser determinado em 1868, o articulista advogava um novo modelo de barretina mais baixa, o que sem dúvida apontava o modelo francês, não o képi, mas uma versão rígida deste, com penacho de crina pendente.
Ainda dentro da influência francesa, o capitão Pimentel pretendia que a polaina apertasse sobre a calça, pelo menos nas marchas. Só nas faxinas e serviço de quartel o soldado usaria a jaqueta em brim cru, o mesmo material das calças de pequeno uniforme.
Com tudo isto pretendia-se que o soldado fosse unicamente dotado para determinado espaço de tempo (dois anos e meio) com um casaco, uma calça de pano, um colete e uma jaqueta de brim, o suficiente para ser acondicionado na mochila e acessórios, não referindo o autor as calças de brim para complementar a jaqueta.
Não fundamentando as suas ideias em factores de natureza estética, o autor defende as suas sugestões argumentando com a questão da operacionalidade e prontidão do soldado para o combate: “Em tempo de guerra que nos tem mostrado a experiencia? Que nem nas marchas, nem nos bivaques na proximidade do inimigo, nem nos postos avançados, se permitte ao soldado desenrolar o capote, porque a muxilla fica por tal forma desordenada, pelo desconcerto da correia de atravessar, da marmita, malote e franqueletes, etc. que se for necessario pegar em armas subitamente, a tropa ver-se-ia em grande confusão. E poderia perder todo o equipamento, ou despender um tempo precioso, cujo desperdicio lhe poderia ser muito funesto.” (Revista Militar, Lisboa, 1860, p. 592).
Ainda no texto que analisámos, é referido um costume relacionado com a higiene do soldado e também com a sua capacidade económica. Pimentel critica o costume (em 1860) de ser permitido ao soldado mandar a roupa a lavar fora, apartando-se dessa tarefa, mesmo que tal lhe dizimasse o soldo, especialmente se acumulasse grandes quantidades de fardamento para a lavagem (idem, p. 592 - 593). Na verdade, a obrigação do soldado de cuidar e lavar a sua própria roupa seria benéfica em termos de auto disciplina e da preservação de hábitos higiénicos, com óbvio reflexo na aparência e imagem do colectivo.
A questão sobre a qualidade e ergonomia dos fardamentos deixava transparecer várias realidades sobre a imposição de legislações sobre uniformes no Exército Português na época da Regeneração. A verdade das casernas sobrepunha-se ao texto oficial dos decretos, pela mão de oficiais maioritariamente de patentes subalternas, que acompanhavam de perto a vida e o quotidiano das suas tropas.
Ficaram testemunhos que atestam a lucidez e cultura de muitos oficiais, no meio de estruturas instáveis e das dificuldades que caracterizavam as forças armadas naquela época, sintoma da existência de uma nova geração de oficiais que irão protagonizar as viragens políticas no início do século XX.
Pese o experimentalismo inédito que precedeu o plano de uniformes de 1856 e a sua tentativa de racionalização dos sistemas uniformológicos e a actualização dos figurinos, os anos seguintes vão demonstrar que as comissões formadas para a elaboração de planos e decretos sobre uniformes dificilmente conseguiam conciliar noções de equilíbrio entre a aparência e a ergonomia, a higiene e a resistência dos materiais, características vulgares em outros exércitos da mesma época. As críticas e as opiniões condenavam e demonstravam a falta de estudo e reflexão sobre a matéria, sobrepondo-se a autoridade das patentes e a cega adopção dos sistemas estrangeiros, pela mera razão de se encontrarem na moda e por advirem de potências militares com domínio geoestratégico, como o foram a França ou a Prússia.
Na verdade, o soldado português continuou a ser dotado com fardamentos pesados, incómodos e de má qualidade, agravando uma já difícil existência, substanciada em quartéis com estruturas deficientes e situados alguns em zonas inóspitas de fraca comunicabilidade. Aliadas a estas circunstâncias, continuavam-se a verificar graves lacunas disciplinares quanto ao uso do uniforme e dos hábitos individuais no campo sanitário.«

Continua

terça-feira, 18 de novembro de 2008

ROTA HISTÓRICA DAS LINHAS DE TORRES

ROTA HISTÓRICA DAS LINHAS DE TORRES
Seminário Internacional e inauguração do circuito de visita da Enxara

Com o objectivo de divulgar a especificidade do sistema militar defensivo de Lisboa, denominado por Linhas de Torres, é organizado o “Seminário Internacional sobre a Importância das Linhas de Torres na Europa”, reunindo no Auditório Municipal de Arruda dos Vinhos, nos dias 20, 21 e 22 de Novembro de 2008, alguns dos mais reputados peritos internacionais neste tipo de património.
No âmbito do programa do seminário, assinala-se ainda a inauguração do primeiro circuito de visita incluído na “Rota Histórica das Linhas de Torres”, projecto dinamizado por uma plataforma intermunicipal que congrega todos os municípios onde se implantam as fortificações: Arruda dos Vinhos, Loures, Mafra, Sobral de Monte Agraço, Torres Vedras e Vila Franca de Xira.
Seminário Internacional sobre a Importância das Linhas de Torres na Europa
Arruda dos Vinhos, 20 a 22 de Novembro de 2008
Com o Alto Patrocínio de Sua Excelência o Presidente da República Portuguesa e o apoio da Real Embaixada da Noruega, constitui o primeiro evento de visibilidade internacional promovido no âmbito da “Rota Histórica das Linhas de Torres”, projecto financiado pela Islândia, Liechtenstein e Noruega através do Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu.
Mais informações em www.cm-arruda.pt/seminariolinhastorres.
Inauguração do Circuito da Enxara
Serra do Socorro, 22 de Novembro de 2008
Este circuito disponibiliza à fruição do público três locais na freguesia de Enxara do Bispo, Concelho de Mafra: a Serra do Socorro, onde foi implantado o posto central de comunicações do exército anglo-luso e no qual o visitante pode conhecer o provável espaço onde se implantava o telégrafo, observar a sua réplica e ainda visitar o Centro de Interpretação e os Fortes da Enxara (obras 28 e 29).
O programa de inauguração inicia-se às 11h30 do dia 22 de Novembro na Serra do Socorro, com transporte assegurado em autocarro, ida e volta, para os fortes da Enxara.
Mais informações em http://www.cm-mafra.pt/.

Comentário do autor do Blog:
Há muito que a Linha de Torres Vedras [com todos os seus fortes e redutos], deveria estar classificada como Património Nacional, senão mesmo na Humanidade, uma vez que se trata de uma das 4 maiores obras de engenharia militar do Mundo. Ao contrário, a sua destruição continua, e já não a ameaça Massena, mas a construção civil, os moinhos eólicos e a ignorância.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Uniformologia Militar Portuguesa.5

Capítulo 5. A pacificação interna e do Exército.

A constante agitação militar e política em Portugal, aliada à sempre eterna crise económica, não permitira grandes inovações em termos uniformológicos, e mesmo com o novo plano de uniformes de 1848, ainda não se verificaria a introdução da túnica ou do casaco, peças de uso prático e recém chegadas às modas militares europeias.
Este plano de uniformes, decretado em 5 de Outubro de 1848, não realizou evoluções estilísticas significantes ao nível de algumas potências europeias, que introduziram novos conceitos uniformológicos, baseados sobretudo no pragmatismo.
Ao analisar-se a iconografia relativa a este plano de uniformes, detecta-se uma evidente simplificação do uniforme básico, mantendo-se, contudo, peças obsoletas como a farda, ou casaca de abas. Por esta época, a casaca de abas passara a uniforme de parada em alguns exércitos europeus, como o francês.
A imposição de padrões de disciplina surge subliminarmente nesta simplificação e padronização relativa dos fardamentos, reaproximando o exército à sua missão de defesa e procurando a sua submissão aos governos e poderes legítimos do Reino, embora tal fosse uma tarefa difícil. A farda teria de deixar de ser um símbolo de ambientes políticos explosivos, para passar a ser uma peça de uniforme de um exército pacificado.
A economia surge aqui como um dos factores mais importantes para a concepção do plano de uniformes de 1848 que, perante a leitura dos sucessivos artigos, aponta para a simplificação dos desenhos e do corte do anterior plano de 1834, mas sem concessões aos novos estilos europeus. Estilisticamente, o panorama uniformológico de Portugal e Inglaterra era similar e atrasado em relação à França, à Prússia e aos estados italianos como a Sardenha, o Piemonte, Nápoles e os inconfundíveis voluntários garibaldinos. Mas é importante também referir que outras potências, como a Rússia e a Espanha, continuavam a manter fardamentos de recorte obsoleto, não abandonando uma certa aparência de Antigo Regime.
O factor económico, no plano de 1848, denotou-se no abandono da dupla abotoadura, ou assertoado, similar ao modelo prussiano de 1815 a 1842, passando a um padrão de fila única e direita de oito botões na frente, fazendo relembrar o uniforme básico de 1806. Isto implicou uma significativa poupança em metal e despesas de punções em botões, e mesmo em tecidos, já que a farda deixou de se trespassar sobre o peito. Este trespasse manteve-se nas sobrecasacas do pequeno uniforme dos oficiais e nas versões triplas dos uniformes de caçadores. Mas à parte estas pequenas modificações, a farda, ou casaca de abas, mantinha o recorte obsoleto do plano anterior, datado de 1834.
Um elemento foi substituído com um toque de evolução e modernidade: a barretina. O modelo pesado, dispendioso e pouco cómodo da barretina de topo de sino (Bell-Toped) de 1834, deu lugar a uma cobertura mais ligeira, com similaridades ao modelo francês de 1845. Esta barretina era de formato troncónico, com a parte frontal colocada a 90º em relação ao crânio, dentro do estilo que irá evoluir para o képi, do qual Portugal se tornará usuário a partir de 1868 - 1869.
Um dos aspectos mais frequentes neste período foi a publicação de decretos em que se apontavam as contínuas faltas de disciplina e os sintomas de desleixo patentes em todos os graus hierárquicos do Exército. Criticou-se, sobretudo, a classe de oficiais, incluindo superiores, tanto pelas alterações caprichosas que faziam nos uniformes regulamentares, como por terem os seus fardamentos em mau estado e por se uniformizarem somente para os actos de serviço, fazendo a sua vida social em trajos civis. Esta situação poderia levar-nos a uma série de leituras e de questões pertinentes, passando todas por uma aparente aversão dos militares portugueses ao uniforme, em particular ao dos oficiais, cujo atavio era suposto ser exemplar. Poder-se-ia depreender que muitos oficiais, alistados nas guerras civis e posteriormente, teriam seguido a carreira das armas por necessidade ou imposição familiar, tal como muitos outros, filhos de famílias de vários estratos sociais, ingressavam na carreira eclesiástica como meio de posicionamento social e económico, mas uns e outros sem real vocação ou apego aos objectivos destas profissões.
De facto, pela leitura dos documentos, não seria difícil observar um comportamento de funcionário de repartição na classe de oficiais do exército, largando o uniforme após as horas de serviço, além das acusações de gastarem os seus proventos em vestuário civil, ao invés de o usarem na manutenção e actualização dos seus uniformes. Esta situação era mais rara nas restantes classes, sargentos e praças, devido aos regulamentos mais coercivos sobre o uso de uniforme e aos magros soldos, muitas vezes dizimados a repor peças de fardamento, precocemente desgastadas pela sua má qualidade. Mais tarde, surgirão legislaturas no sentido de interditar o uso do trajo civil aos militares, dentro e fora da unidade, salvo em condições especiais como licenças prolongadas. Desde Abril de 1810 a Outubro de 1848 são emitidas trinta e uma ordens do exército sobre o uso correcto dos uniformes em todos os graus hierárquicos. Numa época preenchida por guerras civis, golpes e contra golpes, instabilidade política e militar, a disciplina e a uniformidade militar não saíram, certamente, beneficiadas. Daí a constante insistência quanto a estes factos, obrigando o Estado e os altos comandos militares a imporem-se sobre as questões disciplinares e sobre o correcto atavio dos uniformes no Exército, independentemente dos graus hierárquicos.
No ponto nº 7 do artigo XXI, da Ordem do Exército nº 50 de 2 de Outubro de 1848, verificamos que se insiste na disciplina da uniformização do vestuário militar dos próprios oficiais. Isto implicava o corte com possíveis extravagâncias ou liberdades tomadas anteriormente, durante os anos conturbados da instabilidade política. É de notar o que foi decretado, muito antes, na ordem do Exército de 4 de Março de 1811: “O sr. Marechal observa, que apesar da ordem do dia 12 de Abril de 1810, os officiaes se vestem de todos os modos, conforme deseja a sua fantasia: s. exª não vê uniformidade alguma (…)”.
Muito mais tarde, a 7 de Junho de 1851 sai um decreto em que o Comandante em Chefe do Exército, Marechal Duque de Saldanha, adverte a classe de brigadeiros quanto ao incorrecto uso de uniformes não correspondendo a esse grau hierárquico. No caso específico, é referido que brigadeiros graduados tinham o hábito de envergar uniformes de general, quando se apresentavam em formatura com as respectivas unidades. Como é natural, tal atentava contra todos os esforços de disciplinar o exército, esforços desenvolvidos desde há longos anos, traduzidos em muitas ordens do exército e decretos a apontarem para que cada classe hierárquica se confinasse aos seus devidos uniformes, como também aos acessórios e paramentos regulamentares. Claro que as milícias e posteriormente os batalhões e guardas nacionais tentavam fugir a este tipo de imposições, usando do poder económico de muitos dos seus elementos para se uniformizarem de maneiras extravagantes ou, pelo menos, para se subtraírem às regras vestimentárias do exército de linha.
Este assunto voltaria a ser tratado em decreto de 3 de Fevereiro de 1852 na Ordem do Exército nº 12. Nela aborda-se o abuso praticado pelos oficiais do Exército em relação ao uso do traje civil que havia sido regulamentado no longínquo ano de 1819, na Ordem do Dia de 16 de Março. Este desleixo e desapego pelo uniforme, com consequente impacto na disciplina, serviria de exemplo negativo em todos os graus hierárquicos até à classe de praças. Citando alguns pontos eloquentes nesta O.E. nº 12: “Que muitos oficiais do Exercito deixem de ter o completo dos seus uniformes, ou o têem em mau estado, para comprarem e trajarem objectos de uso à paisana.
Que quasi se envergonham de apparecer com os distintivos de sua profissão, por isso que sómente nos actos puramente de serviço é que vestem os seus respectivos uniformes. Que são multiplicadas as pertenções de adiantamento de dinheiro para a compra de uniformes; allegando ora o disposto na Ordem de Exército nº 31 de 1849, ora carência dos meios sufficientes e em os cazos são sempre vistos, fora do serviço com vestuário à paisana.” (O.E. nº 12 de 3/2/1852).
A regulamentação de 3 de Fevereiro de 1852 visava, em suma, exercer um controlo sobre os hábitos de muitos militares trajarem à civil, em alturas consideradas impróprias e lesivas para a imagem do Exército perante a sociedade da época. Eram os militares, sobretudos oficiais, compelidos a reservar o traje civil para ocasiões sociais limitadas e fora dos postos de aquartelamento: “passeios ou divertimento campestre…, bailes de subscrição…” (O.E. nº 12 de 3/2/1852).
Em artigo da Revista Militar, no tomo III, do ano de 1852, mencionava-se a Ordem do Exército nº 12, datada de 1850, que já na altura proibia o uso de vestuário civil pelos militares, citando-se como exemplo a Prússia, onde os oficiais não poderiam entrar no Parlamento sem estarem uniformizados. A leitura do artigo deixa transparecer casos de negligência e de falta de atavio militar: “O despreso das insígnias é o despreso da profissão”. Isto implicava falta de disciplina nos quadros de comando e quiçá falta de motivação a vários níveis da instituição militar (Revista Militar, 1852, p. 92 - 93).
Para além destas questões de base que afectavam o exército regular, havia ainda a considerar a lentidão com que era implantado um plano de uniformes, mesmo em forças de segunda linha.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Medalhas Militares

Para quem gosta de medalhas militares, aqui fica uma bela colecção.
Poderão ver , as medalhas britanicas atribuidas durante a Guerra Peninsular, em especial a Sir Denis Pack (imagem ao lado), que serviu como oficial do Exército Português.




Trata-se do Leiloeira Spink

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Uniformologia Militar Portuguesa.4

Imagem biblioteca nacional
[Militar] [Visual gráfico. - [S.l. : s.n., ca. 185-?]. - 1 gravura : água-forte, color. a guache ; 32x23 cm http://purl.pt/1082. - Data atribuída segundo características formais CDU 355.1(469)"18"(084.1) 762(=1.469)"18"(084.1)


Capítulo 4. O período romântico e o triunfo liberal.



O ideário liberal trouxe novas influências à sociedade portuguesa, incluindo o Exército e, sem dúvida os seus uniformes. A aparência discreta do soldado português, em tons de azul ou castanho, foi progressivamente enriquecida com novos recortes e adornos, típicos do período romântico, sendo o plano de uniformes de 1834 o corolário destas novas tendências. Novos fardamentos, com casacas de dupla fileira de botões, mais justas ao corpo mas mais desconfortáveis, são as primeiras alterações a ser perceptíveis na iconografia que acompanhava aquele plano de uniformes, assim como a velha barretina cilíndrica, herdada dos ingleses, que foi substituída pelo novo, ornado e pesado modelo de topo de sino, de marcadas influências prussiana e francesa. Também outros adornos se tornaram mais exuberantes, como as dragonas e charlateiras, nomeadamente as dos oficiais e da cavalaria, numa profusão de canotões de fios dourados e franjas com as cores regimentais. A cavalaria, anteriormente confinada a uma aplicação táctica indefinida, foi, a partir de 1834, dividida em regimentos de cavalaria ligeira, respectivamente seis regimentos de caçadores a cavalo e dois regimentos de lanceiros. Estes últimos foram uniformizados ao melhor estilo europeu, com jaqueta curta e cintada e com a barretina de topo rectangular, característica deste tipo de tropas, denominada de Schapska, com a sua origem nos regimentos de lanceiros polacos do período napoleónico.
A artilharia também sofreu algumas alterações, tanto na aplicação táctica como nos próprios uniformes, que passaram a distinguir a artilharia de campanha, montada e a artilharia de posição ou de sítio. Mantendo as tradicionais cores e os atributos regimentais da Arma, o encarnado e as peças cruzadas que ornavam as chapas das barretinas, golas e virados das abas das casacas, os artilheiros montados passariam a usar uniformes e armas individuais similares aos da cavalaria, o que incluía sabres, pistolas e carabinas. A farda tinha abas posteriores curtas e rematava-se com um cinto de lã à cavaleiro em vez do talabarte com patrona enquanto os artilheiros a cavalo usavam boldrié com canana, com gancho para carabina. Os artilheiros apeados equipavam-se de maneira semelhante à infantaria, com casacas de abas longas, correames cruzados, com patrona e porta baionetas e eram armados com mosquetes longos de pederneira, do modelo distribuído às Armas apeadas, geralmente Brown Bess inglesas, substituindo-se a baioneta regulamentar de infantaria pelo terçado, espécie de espada curta, característica da Artilharia.
Este plano de uniformes de 1834 significou um relativo romper estilístico com todo um sistema uniformológico que perdurava desde o plano de 1806, assim como acompanhou e reflectiu paralelamente a introdução de novos conceitos tácticos, nomeadamente na cavalaria e na artilharia. É de notar que a maioria dos oficiais do novo exército liberal que saiu da Guerra Civil de 1832-1834 haviam estado emigrados na França e na Inglaterra, onde absorveram as modas militares do período romântico, contrariamente aos quadros de comando das velhas estruturas absolutistas, assumidamente tradicionalistas e impermeáveis às influências externas, atitude que lhes poderá ter provocado a derrota no campo de batalha.
Afastada, aparentemente, a ameaça do absolutismo miguelista, confrontaram-se as facções liberais, divididas entre a esquerda dura dos seguidores da Constituição de 1820 e a direita cartista, defensora da Carta Constitucional, que tinha origem na que havia sido outorgada por D. Pedro, em 1826. No meio, deambulavam os Setembristas (Golpe de Setembro de 1836), constitucionalistas moderados, que no golpe de Fevereiro de 1842 haviam sido afastados do poder por Costa Cabral (Bebiano, 1993, p. 260 - 261).
O exército regular continuava politizado e instável, dividido em várias facções, e era secundado na instabilidade política por inúmeros batalhões de voluntários, herdeiros das antigas milícias e ordenanças. Contudo, o carácter rural destas fora substituído pela componente profundamente burguesa dos referidos batalhões da Guarda Nacional e de voluntários. Estes batalhões, de grande utilidade na guerra civil de 1832-1834, tornaram-se em contingentes de duvidoso valor militar, por vezes pretexto para uma certa burguesia envergar um uniforme, de preferência vistoso, e para exibir um mosquete e uma baioneta pelas ruas. E à semelhança de algumas dessas guardas, também elas perdiam muitas vezes o entusiasmo quando enfrentadas por tropas regulares, não restando outra solução senão voltar a entregar o mosquete e volver a casa.
Para se ter uma ideia da proliferação destas unidades de voluntários, refira-se que, entre 26 de Dezembro de 1840 e 14 de Fevereiro de 1850, as Ordens do Exército (O.E.) registam oitenta e cinco batalhões e companhias de voluntários de infantaria, cavalaria e artilharia, e deste número destacam-se vinte e nove batalhões de caçadores (Brito, 1988, p. 18 - 19). Para um país pequeno como Portugal, esta quantidade inusitada de unidades era flutuante, sendo os batalhões e companhias convocados e desmobilizados, conforme a situação política do momento. As mobilizações são intensas entre 1840 - 1841, no período que antecede o golpe de Fevereiro de 1842, e depois em 1846 - 1847, com o deflagrar da guerra civil da Patuleia. É de notar a proficuidade de batalhões ou companhias de caçadores, vinte e nove num total das já referidas oitenta e cinco unidades. É compreensível, dado o sentido de elite que o uniforme de caçadores, adoptado por estas unidades, conferia ao seu usuário, mesmo que o seu desempenho militar não correspondesse ao garbo da farda. Os uniformes de caçadores continuavam, na década de 1840, a manter as características básicas que tornavam tão solicitados por muitas unidades de voluntários. Assim, mantinha-se o castanho pinhão, com adornos em negro, como cores gerais para todas as peças do uniforme, factor que iria perdurar desde 1806 até, praticamente, ao plano de uniformes de 1885.
Continua

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Remembrance Day. Poppy Day


http://www.youtube.com/watch?v=e4NtSqZcT_4&feature=related

Hoje, é o dia Remembrance Day na maioria das nações que compõem a Commonwealth .

In Flanders Fields
by John McCrae, May 1915



In Flanders fields the poppies blow
Between the crosses, row on row,
That mark our place; and in the sky
The larks, still bravely singing, fly
Scarce heard amid the guns below.

We are the Dead. Short days ago
We lived, felt dawn, saw sunset glow,
Loved and were loved, and now we lie
In Flanders fields.

Take up our quarrel with the foe:
To you from failing hands we throw
The torch; be yours to hold it high.I
f ye break faith with us who die
We shall not sleep,though poppies grow
In Flanders fields.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Uniformologia Militar Portuguesa.3

Capítulo 3. O período da Guerra Peninsular

Em 1806 foi decretado novo plano de uniformes, perfeitamente adaptado às modas militares da Europa e em que o obsoleto tricórnio, a véstia e a velha pantalona pelo joelho foram sustituídos pela barretina e por um fardamento mais simples e sóbrio, composto pela casaca de abas azul ferrete, agora a fechar pela cintura, e as calças, divididas em modelo de Inverno e modelo de Verão. O primeiro tipo de calça, em lã azul ferrete, apertava pelo tornozelo e complementava-se com polainas de pano grosso preto sobre a calça e o sapato. O segundo tipo era confeccionado em linho branco ou alvadio, e o seu recorte era invulgar, já que era rematada na sua parte inferior por uma pala semelhante a uma polaina que apertava entre o tacão e a sola do sapato. Os regimentos de linha eram agora diferenciados, somente, pela combinação cromática das golas, dos canhões das mangas e dos forros das casacas. Os uniformes da milícia, ou a segunda linha, eram semelhantes aos das tropas regulares e seguindo o método distintivo da primeira linha, apenas se colocando os nomes das localidades regimentais na barra inferior de latão da barretina. A terceira linha, constituída pelas ordenanças, de carácter fortemente rural, possuía fardamentos mais peculiares à base de tecidos grosseiros de cor castanha como o burel ou a saragoça, este um tecido de origens beirãs. Em 1809 a infantaria ligeira é convertida nos corpos de caçadores, assumindo por muitos anos o carácter, justificado, de tropas de élite e extremamente apreciadas pelos altos comandos britânicos durante a Guerra Peninsular. Os caçadores de infantaria caracterizavam-se pelos seus uniformes castanhos, geralmente, do já referido tecido de saragoça destinado a sargentos e praças e em tecidos mais nobres para oficiais. Indubitavelmente baseados nos regimentos de atiradores britânicos, uniformizados de verde, o 95th e o 60th Rifles Regiments, os caçadores, cuja técnica de combate se efectuava em ordem dispersa e valendo-se da perícia dos seus atiradores em alvos selectivos, ao contrário da infantaria de linha que actuava em ordem cerrada e cujo fogo se fazia maciçamente em descargas cerradas, necessitavam de uniformes que os dissimulassem na paisagem, evitando a sua detecção pelo inimigo. Este conceito foi igualmente adoptado pelos exércitos austríacos com os seus FeldJäger, fardados de cinza escuro e que foram adversários temíveis das tropas napoleónicas. Curiosamente estes últimos, apesar de possuírem caçadores a cavalo (Chasseurs à Cheval) com uma filosofia de uso de acordo com as tácticas de cavalaria ligeira, contavam com unidades de infantaria ligeira (Voltigeurs) mas desprovidos de armas raiadas, contrariamente aos portugueses e ingleses, fiéis usuários da carabina raiada de pederneira Baker, ou dos austríacos com a sua Jäger Karabine.
Ainda no contexto da Guerra Peninsular, a cavalaria e a artilharia portuguesas também se uniformizavam de azul ferrete, embora com fardamentos característicos, decretados pelo plano de uniformes de 1806, consistindo na farda curta, calção, bota e capacete de couro, tipo Tarleton, ornado com cresta de crina de cavalo para os primeiros e fardamento similar ao da infantaria para os artilheiros. As diferenciações regimentais faziam-se como na infantaria.
Apesar das profundas reorganizações levadas a cabo por Wellington e Beresford, os uniformes do Exército Português mantiveram o seu corte básico até à Guerra Civil de 1832-1834.

Continua

domingo, 9 de novembro de 2008

Uniformologia Militar Portuguesa.2

Capítulo 2. Breve Panorâmica sobre o séc. XVIII

As primeiras referências concretas a uma unidade vestimentária nas forças armadas portuguesas surgem em 1740, na obra A Milicia Pratica de Bento Coelho, já com a representação gráfica dos fardamentos. No entanto, estes apresentavam um estilo muito aproximado às modas militares francesas, com origem nas reestruturações levadas a cabo no período de Luís XIV e demonstrando a influência que a França tinha na corte portuguesa de D. João V, ele também um déspota esclarecido. Se um regime político servia de modelo, era normal seguir-se-lhe a estrutura militar, tanto na aparência como nos equipamentos e tácticas de combate, conceito que nos acompanhará ao longo deste texto e perfeitamente adaptável à realidade militar portuguesa do século XVIII até à guerra colonial de 1961-1974.
Com a crescente ameaça espanhola e no contexto da Guerra dos Sete Anos, o Exército, que havia chegado a um estado lamentável de desleixo e abandono por parte dos poderes políticos e militares, viu-se obrigado, na década de 1760, a um esforço de reorganização rápida, pressionada pelas incursões espanholas em território português. Apesar de uma primeira tentativa de regulamentação de fardamentos em 1762, que pela primeira vez apresentou uma série de gravuras coloridas, permitindo a visualização dos uniformes, vai ser em 1764, com o comando e organização do Exército entregues ao Conde de Lippe, que os uniformes vão ser devidamente regulamentados, tanto em termos teóricos como gráficos. Na verdade, os decretos de 1764 vão-se tornar no primeiro plano de uniformes do Exército Português, com um elevado índice de uniformidade, demonstrado pela adopção de uma cor base para as casacas de abas, o azul ferrete. As diferenciações regimentais surgiam nas cores dos canhões das mangas, golas, forros e, até 1800, pelas cores das véstias e pantalonas. Sem dúvida que se fosse possível, hoje, ver uma divisão de infantaria uniformizada pelo plano de 1764, alinhada num campo de batalha, ser-nos-ia fácil constatar que, apesar das referidas cores regimentais, distribuídas por várias peças de vestuário e peças de adorno, a mancha cromática dominante seria o azul ferrete regulamentar. Isto não excluía que existissem regimentos com cores individualizadas, tais como unidades de emigrados do pós - Revolução Francesa ou mercenários Suíços que chegaram a estar ao serviço de D. José e D ª Maria I, trajando-se aqueles com casacas vermelhas, mais uma vez à semelhança dos Cent Suisses da corte francesa, ou ainda certos regimentos destacados para as colónias e cujos uniformes chegaram a ser castanhos ou verdes. Com a administração de Lippe, o Exército Português tornou-se numa máquina de guerra eficiente e bem uniformizada, com a forte influência prussiana do seu mentor, capaz de dissuadir os arremedos expansionistas da coroa espanhola. Apesar do afastamento do Conde de Lippe causado pelo omnipresente despeito de muitos oficiais, provenientes de uma larga parte de uma aristocracia amorfa e medíocre, mas hábil em intrigas palacianas e ministeriais, o mote cromático estava estabelecido - o Exército Português ir-se-ia fardar de azul ferrete até 1908, altura em que adoptou o cinzento como cor de campanha. Após Lippe, as estruturas militares voltaram a um pronunciado declínio, tristemente demonstrado na Guerra das Laranjas de 1801, em que se impôs ao Exército o comando do idoso e incapaz Duque de Lafões, inábil em levar as tropas a conter as arremetidas das tropas espanholas do valido Godoy.
Continua

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Uniformologia Militar Portuguesa-1

Uniformologia Militar Portuguesa
1806-1892
O Jogo das Regras e Excepções

A historiografia militar em Portugal careceu durante muitos anos da abordagem científica das características que envolvem o complexo mundo dos uniformes militares. Estes passam para além da simples análise da forma, da cor e da simbologia, entram indubitavelmente na área das ciências sociais, no momento em que se começa a abordar a relação homem/uniforme.

Capítulo 1. Contexto Geral
A uniformologia tornou-se uma ciência auxiliar da História Militar e da História em geral, dotada desde cedo com metodologias apropriadas e com extensas componentes materiais e humanas. O uniforme, no seu sentido mais lato, surge a par com o nascimento, a partir de meados do século XVII, dos regimes do despotismo esclarecido e com o estabelecimento do centralismo estatal. Mesmo os eternos mercenários, que um pouco por toda a Europa vendiam os seus talentos na espada, na alabarda e no mosquete, tiveram que abandonar a sua liberdade vestimentária, para se submeterem às regras da uniformidade, como sucedeu com a guarda suíça dos reis de França e do Papa. O colorido individualista, que caracterizava o soldado europeu desde a queda do Império Romano do Ocidente até às guerras do Renascimento, deu lugar a uma gradual uniformização, que evoluía a par com a arte e o engenho mortífero da guerra, sobretudo com o advento da pólvora e das armas de fogo. A uniformização foi inicialmente imposta a nível regimental, com particular incidência nos fins do século XVII e durante todo o século XVIII, continuando a subsistir um xadrez assaz colorido nos campos de batalha daqueles tempos, mas denotando uma uniformidade organizada e obrigatoriamente visível através dos densos lençóis do fumo da pólvora negra.
O decorrer do século XIX iria finalmente fazer com que os exércitos se uniformizassem no seu todo, à excepção de alguns corpos de élite e das guardas reais e presidenciais.
Embora se possa falar de uma moda do vestuário militar, ditada geralmente pelas grandes potências e não poucas vezes adoptada pelos exércitos de pequenos países que pela aparência nela se reviam, isso não obstava a que a eficiência em combate desses pequenos exércitos, por vezes exuberantes mas mal armados e treinados, deixasse muito a desejar nos campos de batalha, criando uma diferença prática entre a aparência e a realidade.
Em termos uniformológicos, as forças armadas portuguesas não fugiram à regra das suas congéneres europeias, embora com as condicionantes ditadas pela periferia geográfica, económica e cultural de Portugal, aliadas a uma endémica vida politíca mal gerida.
Continua

Uniformologia Militar Portuguesa.

Irei dar inicio à colocação de um excelente trabalho de Sérgio Veludo Coelho, cujo titulo é:

Uniformologia Militar Portuguesa
1806-1892
O Jogo das Regras e Excepções

Gostaria de agradecer ao autor do texto tê-lo partilhado comigo, e deste modo com os leitores do Lagos Militar.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Silveira [Conde de Amarante], um estranho oficial.

Lendo o 1º volume das Colecção das Ordens do Dia , referente ao ano de 1809, constata-se em relação a Silveira [futuro Conde de Amarante] um aspecto que lhe é único, no que às Ordens do Dia diz respeito.
Trata-se de um oficial que se queixa constantemente dos oficiais sob o seu comando, e pretende por esta via, encontrar responsáveis para os seus actos e as suas falhas.
Não se compreende a sua atitude.
No fim da guerra seria acusado por Wellington do contrario. Em 1813, referindo-se à possibilidade de ver o seu exército desmembrado pelas intrigas de Silveira, diz a Stuart:
“My opinion of Silveira is very much altered. He possesses not one military quality; and he has been repeatedly guilty of (…) courting popularity with the common soldiers, by flattering their vices, and by impunity from their misconduct. Such a man will not do in this army!”, - Carta de Wellington a Stuart de 8 de Novembro de 1813, Wellington Papers, vol 1, p.381.

Mas vamos ao ano de 1809.

A primeira Ordem do Dia , é de 9 de Agosto de 1809.

«O Marechal Comandante em Chefe do Exército , achando por uma informação do Marechal de Campo Silveira, que poderia ter más consequencias a entrada do Coronel Bernardo do Carmo no Regimento de Infantaria nº 24 pelo descontentamento geral, que isto ocasionaria no mesmo Regimento ; ordenou que o Tenente-coronel conservasse o Comando deste; porem, tendo achado pelas representações , que lhe foram feitas em Almeida onde está o regimento , e pela averiguações que mandou fazer, que a informação do Marechal de Campo era muito mais forte do que pediam as circunstancias , não quer demorar-se em fazer justiça ao Coronel Bernardo do Carmo, o qual tomará o lugar no Regimento segundo a patente que tem.»

Na Ordem do Dia de 26 de Dezembro, podem ler-se duas acusações de Silveira e as respectivas sentenças do Conselho de Guerra.
A primeira acusação ao Coronel de Cavalaria Francisco Guedes de Carvalho e Menezes, Coronel do Regimento de Cavalaria 9.
Este oficial foi absolvido.
A segunda ao Tenente-Coronel agregado ao Regimento de Infantaria 12, Francisco Homem de Magalhães Pissarro [ Pizarro].
Também este oficial acabaria por ser absolvido.

Não transcrevo as acusações e sentenças pela sua extensão, mas elas falam por si do modo inconstante e pouco claro e dúbia como ele [Silveira] dava as ordens aos seus subordinados.

Estranho também tratar-se do mesmo oficial que quase foi preso por hesitar juntar-se ao levantamento contra os Franceses. Acúrcio das Neves, na sua obra publicada ainda durante a Guerra Peninsular, «Historia Geral da Invasão dos Franceses em Portugal e da Restauração deste Reino» José Acúrcio das Neves, vol. 2, pp. 80-81, já fazia reparos à personalidade ambiciosa e insubordinada de Silveira. Fazia-lo nos seguintes termos:
“O tenente-coronel de cavalaria (hoje marechal de campo) Francisco da Silveira Pinto da Fonseca foi um dos oficiais militares que Sepúlveda chamou junto a si, logo desde os primeiros momentos da restauração; e Silveira, irresoluto ainda, deixou-se ficar em Vila Real, onde se achava; apenas porém ali rompeu a revolução, pôs-se à frente dela. Vila Real tomando-se a émula de Bragança, Silveira foi o competidor de Sepúlveda: fez-se independente deste general e declarou-se chefe da revolução. É assim que começou a sua carreira um general ilustre, que depois se tem assinalado por tão distintos serviços, como tem feito ao Soberano e à pátria na segunda restauração de Chaves, na defesa das províncias do Norte, na Galiza mesmo, e na Beira Alta, onde neste momento está servindo de barreira à entrada de novos reforços do inimigo, e cortando as comunicações a Massena.
Não cumpriu as determinações de Sepúlveda, e Sepúlveda chegou ao ponto de enviar o brigadeiro (hoje Tenente-general) Manuel Pinto Bacelar- para o prender. Bacelar contemporizou, pensando poder reduzir as coisas à devida ordem sem tocar os extremos: não o conseguiu”

sábado, 1 de novembro de 2008

Efectivos do Regimento de infantaria de Lagos. 1808-1814

Efectivos do Regimento de infantaria de Linha nº 2 ,
( regimento de Infantaria de Lagos),
durante a Guerra Peninsular.
Dezembro de 1809 - 1351 homens.
Dezembro de 1810 – 1521 homens.
Dezembro de 1811 - 1545 homens.
Dezembro de 1812 - 1566 homens.
Dezembro de 1813 - 1344 homens.
Dezembro de 1814 - 1555 homens.

Efectivos do Regimento de infantaria de Tavira. 1808-1814


Efectivos do Regimento de infantaria de Linha nº 14,
( regimento de Infantaria de Tavira),
durante a Guerra Peninsular.

Dezembro de 1809 - 1275 homens.
Dezembro de 1810 – 1506 homens.
Dezembro de 1811 - 1535 homens.
Dezembro de 1812 - 1530 homens.
Dezembro de 1813 - 1251 homens.
Dezembro de 1814 - 1084 homens.