[Militar] [Visual gráfico. - [S.l. : s.n., ca. 185-?]. - 1 gravura : água-forte, color. a guache ; 32x23 cm http://purl.pt/1082. - Data atribuída segundo características formais CDU 355.1(469)"18"(084.1) 762(=1.469)"18"(084.1)
Capítulo 4. O período romântico e o triunfo liberal.
O ideário liberal trouxe novas influências à sociedade portuguesa, incluindo o Exército e, sem dúvida os seus uniformes. A aparência discreta do soldado português, em tons de azul ou castanho, foi progressivamente enriquecida com novos recortes e adornos, típicos do período romântico, sendo o plano de uniformes de 1834 o corolário destas novas tendências. Novos fardamentos, com casacas de dupla fileira de botões, mais justas ao corpo mas mais desconfortáveis, são as primeiras alterações a ser perceptíveis na iconografia que acompanhava aquele plano de uniformes, assim como a velha barretina cilíndrica, herdada dos ingleses, que foi substituída pelo novo, ornado e pesado modelo de topo de sino, de marcadas influências prussiana e francesa. Também outros adornos se tornaram mais exuberantes, como as dragonas e charlateiras, nomeadamente as dos oficiais e da cavalaria, numa profusão de canotões de fios dourados e franjas com as cores regimentais. A cavalaria, anteriormente confinada a uma aplicação táctica indefinida, foi, a partir de 1834, dividida em regimentos de cavalaria ligeira, respectivamente seis regimentos de caçadores a cavalo e dois regimentos de lanceiros. Estes últimos foram uniformizados ao melhor estilo europeu, com jaqueta curta e cintada e com a barretina de topo rectangular, característica deste tipo de tropas, denominada de Schapska, com a sua origem nos regimentos de lanceiros polacos do período napoleónico.
A artilharia também sofreu algumas alterações, tanto na aplicação táctica como nos próprios uniformes, que passaram a distinguir a artilharia de campanha, montada e a artilharia de posição ou de sítio. Mantendo as tradicionais cores e os atributos regimentais da Arma, o encarnado e as peças cruzadas que ornavam as chapas das barretinas, golas e virados das abas das casacas, os artilheiros montados passariam a usar uniformes e armas individuais similares aos da cavalaria, o que incluía sabres, pistolas e carabinas. A farda tinha abas posteriores curtas e rematava-se com um cinto de lã à cavaleiro em vez do talabarte com patrona enquanto os artilheiros a cavalo usavam boldrié com canana, com gancho para carabina. Os artilheiros apeados equipavam-se de maneira semelhante à infantaria, com casacas de abas longas, correames cruzados, com patrona e porta baionetas e eram armados com mosquetes longos de pederneira, do modelo distribuído às Armas apeadas, geralmente Brown Bess inglesas, substituindo-se a baioneta regulamentar de infantaria pelo terçado, espécie de espada curta, característica da Artilharia.
Este plano de uniformes de 1834 significou um relativo romper estilístico com todo um sistema uniformológico que perdurava desde o plano de 1806, assim como acompanhou e reflectiu paralelamente a introdução de novos conceitos tácticos, nomeadamente na cavalaria e na artilharia. É de notar que a maioria dos oficiais do novo exército liberal que saiu da Guerra Civil de 1832-1834 haviam estado emigrados na França e na Inglaterra, onde absorveram as modas militares do período romântico, contrariamente aos quadros de comando das velhas estruturas absolutistas, assumidamente tradicionalistas e impermeáveis às influências externas, atitude que lhes poderá ter provocado a derrota no campo de batalha.
Afastada, aparentemente, a ameaça do absolutismo miguelista, confrontaram-se as facções liberais, divididas entre a esquerda dura dos seguidores da Constituição de 1820 e a direita cartista, defensora da Carta Constitucional, que tinha origem na que havia sido outorgada por D. Pedro, em 1826. No meio, deambulavam os Setembristas (Golpe de Setembro de 1836), constitucionalistas moderados, que no golpe de Fevereiro de 1842 haviam sido afastados do poder por Costa Cabral (Bebiano, 1993, p. 260 - 261).
O exército regular continuava politizado e instável, dividido em várias facções, e era secundado na instabilidade política por inúmeros batalhões de voluntários, herdeiros das antigas milícias e ordenanças. Contudo, o carácter rural destas fora substituído pela componente profundamente burguesa dos referidos batalhões da Guarda Nacional e de voluntários. Estes batalhões, de grande utilidade na guerra civil de 1832-1834, tornaram-se em contingentes de duvidoso valor militar, por vezes pretexto para uma certa burguesia envergar um uniforme, de preferência vistoso, e para exibir um mosquete e uma baioneta pelas ruas. E à semelhança de algumas dessas guardas, também elas perdiam muitas vezes o entusiasmo quando enfrentadas por tropas regulares, não restando outra solução senão voltar a entregar o mosquete e volver a casa.
Para se ter uma ideia da proliferação destas unidades de voluntários, refira-se que, entre 26 de Dezembro de 1840 e 14 de Fevereiro de 1850, as Ordens do Exército (O.E.) registam oitenta e cinco batalhões e companhias de voluntários de infantaria, cavalaria e artilharia, e deste número destacam-se vinte e nove batalhões de caçadores (Brito, 1988, p. 18 - 19). Para um país pequeno como Portugal, esta quantidade inusitada de unidades era flutuante, sendo os batalhões e companhias convocados e desmobilizados, conforme a situação política do momento. As mobilizações são intensas entre 1840 - 1841, no período que antecede o golpe de Fevereiro de 1842, e depois em 1846 - 1847, com o deflagrar da guerra civil da Patuleia. É de notar a proficuidade de batalhões ou companhias de caçadores, vinte e nove num total das já referidas oitenta e cinco unidades. É compreensível, dado o sentido de elite que o uniforme de caçadores, adoptado por estas unidades, conferia ao seu usuário, mesmo que o seu desempenho militar não correspondesse ao garbo da farda. Os uniformes de caçadores continuavam, na década de 1840, a manter as características básicas que tornavam tão solicitados por muitas unidades de voluntários. Assim, mantinha-se o castanho pinhão, com adornos em negro, como cores gerais para todas as peças do uniforme, factor que iria perdurar desde 1806 até, praticamente, ao plano de uniformes de 1885.
Continua
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